quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Sozinhez


Sozinhez é sina
E não vem da sala vazia
Nem da cadeira sem sentante
Nem do bodoque sem menino
Ela não vem de cima
Feito castigo divino
É destino
É por dentro
Nascida e crescida
Banhada em ungüento
De batismo
É cataclismo
Silencioso
Que quase mata
Mas não
(a sádica)
É calo na ponta do coração
Pendendo pro lado esquerdo
E, esporádica,
Causa inquietância
Medo
Sede
Transparência
Ou cor da mais próxima parede.
Sozinhez é amiga de infância
Mal de filho único
Ou de quem tem mais irmãos
Que os dedos podem contar
E, cadela, é mancomunada
Com todo o silêncio que há
Nos telefones que não tocam
Nas cartas que não chegam
Nas pessoas que não sentem saudade
Nem nada.

Sozinhez não é coisa de idade
É marca de nascença na testa
É maldade
Da simples natural seleção
É festa
Em sótão cheio de fantasma
Esse calo pressionando o pulmão
Essa falta de ar que me pasma.

Sozinhez é asma.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Tereza e a Estante


Os olhos grandes olham, com lascívia
O coração pulsando, muito alerta
Os homens dispostos à sua frente

Fita-os ela, com a boca entreaberta
De crianças olhando pipoca quente
Despejada em saquinhos, fresquinha
Os mesmos olhos brilhantes
Da menina e a pipoca:
É minha!
Tereza e seus possíveis amantes

Ergue uma das mãos, em incerteza
E desliza-lhes os dedos pelos torsos
Vacila, pondera, sobre quem a mereça
Puxa-os para si e toca-lhes os rostos
Um a um os sente, vagarosa
Que essas horas dispensam avareza

(Depois conta ela, fingida,
Essa menina Tereza
Metade cenho franzido,
Diz ela por pura estranheza
Metade sorrisinho torto, metido
De quem não diz, mas tá prosa):

Veio Vinícius, num andar atrevido
Co’umas propostas muito indecorosas
De brigadeiro, purê e Europa

E enquanto Pablo jurava um amor de pureza
Jorge apostava que eu era menina fogosa
Já Carlos era doce nos versos
Homem cheio de sutilezas

Até Gabriel chegar, em polvorosa
E me acusar de, na verdade, ser princesa
De um lugarejo longe, descartado
Dos mapas, dos ventos da rosa,
Repleto de paisagens pitorescas.


Ah, Terezinha, eu entendo
Que assim só com nervos de aço
Entendo tanto que tou vendo
Você saindo de fino
Com todos debaixo do braço
(hein, sacana!)
E sei que está pensando em um
Pra cada dia da semana.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008